“Carta da Lapa”: Bispos da Bacia do São Francisco se posicionam em defesa do Velho Chico

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Foto Capa rio são francisco
Rio São Francisco em Bom Jesus da Lapa//Foto: José Hélio/Notícias da Lapa

“Nós constatamos, é evidente que não é mais um relato, já é um fato, que o rio São Francisco está morrendo, por isso nós como pastores do povo de Deus, leigos e legas, agentes de pastorais, não podemos ficar indiferentes; onde o Papa Francisco diz, que a epidemia do nosso tempo, a doença do nosso tempo é a indiferença, o descaso. A ideia desse encontro, nasce da necessidade de nós bispos estudarmos essa realidade gravíssima da situação que se encontra o velho Chico”, falou Dom Carlos Alberto Breis Pereira, bispo de Juazeiro, no I Encontro dos Bispos em Bom Jesus da Lapa.

Em comunhão com o Papa Francisco e inspirados pela carta encíclica “Laudato Sí”, que trata da desigualdade planetária, a deterioração da vida humana e sobre os impactos ambientais que as atividades humanas têm causado ao planeta. Onze bispos da bacia do Rio São Francisco, representando as dezesseis dioceses banhadas pelo rio, dos estados de Pernambuco, Minas Gerais, Bahia e Sergipe, lançaram  neste primeiro domingo do advento(3) a “Carta da Lapa”. O documento  é fruto do I Encontro dos Bispos da Bacia do São Francisco, que aconteceu no mês de novembro em  Bom Jesus da Lapa, onde as representações da Igreja Católica, preocupados com a conjuntura hídrica dos rios e nascentes da região, responsáveis pela sobrevivência do Velho Chico, buscaram se inteirarem de forma mais crítica da realidade ambiental da região da Bacia do São Francisco.

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I Encontro dos Bispos da Bacia do São Francisco, em Bom Jesus da Lapa/Foto: José Hélio/Notícias da Lapa

Na carta os bispos afirmam que “diante do processo de morte em que este Rio se encontra e das consequências que isto representa para a população que dele depende, assumimos de forma colegiada a defesa do Velho Chico, de seus afluentes e do povo que habita sua bacia”.

E  apresentam seis  ações que os  bispos, junto a suas  dioceses irão buscar construir, como: (1) convoca os cristãos a se sensibilizarem com a causa, em defesa dos rios; (2) vão visitar todas as comunidades em suas dioceses, com o propósito de fortalecer o debate em defesa dos rios; (3) vão criar ferramentas de comunicação e informação capazes de fortalecer a luta ambiental na bacia; (4) vão apoiar e incentiva e ações populações que estejam preocupadas com a preservação vida, respeitando os biomas; (5) criação da moratória do Cerrado; (6) chamar as autoridades federais, estaduais, municipais, senadores, deputados e Ministério Público  para que assumam a responsabilidade ambiental na bacia junto as  populações.

Leia a “Carta da Lapa” na integra:

“Nas margens da torrente, de um lado e de outro, haverá toda espécie de árvores com frutos comestíveis, cujas folhas e frutos não se esgotarão. Essas árvores produzirão novos frutos de mês em mês, porque a água da torrente provém do santuário. Por isso, os frutos servirão de alimentos e as folhas de remédio” (Ez 47,12).
À luz do Evangelho, em comunhão com o Papa Francisco e inspirados pela carta encíclica “Laudato Sí”, nós, bispos da bacia do Rio São Francisco, representando onze das dezesseis dioceses, diante do processo de morte em que este Rio se encontra e das consequências que isto representa para a população que dele depende, assumimos de forma colegiada a defesa do Velho Chico, de seus afluentes e do povo que habita sua bacia.
Como pastores a serviço do rebanho que nos foi confiado, constatamos, com profunda dor: (a) o sumiço de inúmeras nascentes de pequenos subafluentes e, em consequência, o enfraquecimento dos afluentes que alimentam o São Francisco; (b) o aumento da demanda da água para a irrigação, indústria, consumo humano e outros usos econômicos, sem levar em conta a capacidade real dos rios de ceder água; (c) a destruição gradativa das matas ciliares expondo os rios ao assoreamento cada vez maior;  (d) a decadência visual dos rios e da biodiversidade;  (e) o aumento visível dos conflitos na disputa pela água em toda a região;  (f) empresas sempre fazem prevalecer seus interesses e o Estado acaba por ser legitimador de um modelo predatório de desenvolvimento. Tudo isso vem gerando a destruição lenta e cruel da biodiversidade do Velho Chico e, consequentemente, sua morte gradativa.

Diante dessa triste realidade, enquanto bispos da bacia do Rio São Francisco e pastores do rebanho que nos foi confiado, propomos:
1. Sermos uma “Igreja em Saída”: Ir ao encontro do povo e, como pastores, convocar os cristãos e as pessoas sensíveis à causa, para juntos assumirmos o grande desafio de salvar o rio da morte e garantir a vida humana, da fauna e da flora que dele dependem;
2. Sermos uma “Igreja Missionária”: Realizar visitas às nossas comunidades, missões, peregrinações, romarias e estabelecer um diálogo aberto com as pessoas para que entendam e assumam, à luz da fé, o cuidado com a “Casa Comum”, particularmente, a defesa do nosso Rio;
3. Sermos uma “Igreja Profética”: Elaborar subsídios educativos sobre meio-ambiente e o modo de preservá-lo. Utilizar os meios de comunicação, rádios, periódicos diocesanos para levar ao maior número de pessoas a boa nova da preservação da vida; 4. Sermos uma “Igreja Solidária”: Reforçar as iniciativas populares de recomposição florestal, recuperação de nascentes, revitalização de afluentes; incentivar a ética da responsabilidade socioambiental capaz de gerar um modo de vida sustentável de convivência com a caatinga, o cerrado e a mata atlântica; defender políticas públicas para implementação do saneamento básico, apoio à agricultura familiar, manutenção de áreas preservadas, a exemplo dos territórios das comunidades tradicionais de fundo e fecho de pasto, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores, etc. 5. Finalmente, declaramos nossa posição em defesa do “Repouso Sabático” para os nossos biomas a fim de que possam se reconstituir. Particularmente, uma moratória para o Cerrado, por um período de dez anos. Durante esse período não seria permitido nenhum projeto que
desmate mais ainda o Cerrado, a Caatinga e a Mata Atlântica, biomas que alimentam o Rio São Francisco e dele também se alimentam. 6. Nesse sentido chamamos as autoridades federais, os governadores, prefeitos, deputados, senadores, o Ministério Público, para que assumam sua responsabilidade constitucional na defesa do Velho Chico
e do seu povo. Que São Francisco, padroeiro da Ecologia e do Rio que traz o seu nome,
nos inspire a cuidar da Criação. Que o Bom Jesus da Lapa, de cujo Santuário provém a água da torrente, abençoe e dê vida ao nosso Velho Chico e ao povo do qual ele é pai e mãe.

Bom Jesus da Lapa, 1º Domingo do Advento de 2017.

Bispos Participantes
Dom José Moreira da Silva – Bispo de Januária (MG)
Dom José Roberto Silva Carvalho – Bispo de Caetité (BA)
Dom João Santos Cardoso – Bispo de Bom Jesus da Lapa (BA)
Dom Josafá Menezes da Silva – Bispo de Barreiras (BA)
Dom Luiz Flávio Cappio, OFM – Bispo de Barra (BA)
Dom Tommaso Cascianelli, CP – Bispo de Irecê (BA)
Dom Carlos Alberto Breis Pereira, OFM – Bispo de Juazeiro (BA)
Monsenhor Malan Carvalho – Administrador Diocesano de Petrolina (PE)
Dom Gabriele Marchesi – Bispo de Floresta (PE)
Dom Guido Zendron – Bispo de Paulo Afonso (BA)

2 COMENTÁRIOS

  1. Se não fizermos nada certamente não terá fura geração nessa região …. As prefeituras da bacia do São Francisco deveriam se mobilizar e reflorestar as áreas em degradação pois são muitas … Do jeito que vai … O velho Chico não aguentará mais 20 anos de sofrimento … Pois são muitos dejetos jogado nesse Rio !!!!
    Agora a transposição ..,

  2. Parabéns a esses bispos que estão lutando por esta causa tão nobre. Meu coração enche de alegria en saber que tem pessoas com esse olhar. Eu fui criada a margem do velho chico, vendo tanta água nunca pensei na que um dia ia vê _lo seco. Pois bem: na cidade de Paratinga na qual eu naci, o braço que passava beirando a cidade ja não esiste mais. Pois no leito do rio muitos estão estão plantantando árvores que aterra ainda mais e fazendo cercas mais cercas etc.

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