Comunidades Quilombolas sentem ameaçadas com a falta de transparência no licenciamento dos Parques Solares em Bom Jesus da Lapa

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Início de mês de maio de 2017 o município de Bom jesus da Lapa passou a ser destaque em várias capas de jornais do país, se tornando uma referência na produção de energia solar, com maior projeto de geração solar em operação no Brasil, parque solar fotovoltaico da Enel Green Power, subsidiária brasileira do grupo italiano Enel. Com um investimento de cerca de US$ 175 milhões, o projeto foi concedido ao grupo em agosto de 2015 no leilão de reserva feito pela Agência Nacional de Energia Elétrica e o contrato de fornecimento é de 20 anos.

O incentivo a implantação de Parques Solares tem sido uma das bandeiras do Prefeito de Bom Jesus da Lapa, Eures Ribeiro, que tem incentivado a vinda de várias empresas desse seguimento, aproveitando as condições privilegiadas do município para conseguir novos investimentos no município. Que além do parque da Enel em funcionamento, já tem outras estruturas em processo de construção, e a previsão de novas implantações.

Parque visitado pela equipe do Notícias da Lapa com um representante do Território Quilombola, a obra foi iniciada sem a comunidade saber.
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E por mais que a gestão municipal garanta que tudo tem seguido o que manda a legislação ambiental, e todas as precações necessárias estão sendo tomadas, vários questionemos surgem paralelos a esse processo. Uma das reclamações vem da Associação Quilombola Agropastoril de Araça/Volta, que alegam que a Secretaria de Meio Ambiente de Bom Jesus da Lapa liberou a construção de dois Parques Solares no raio de sobreposição as comunidades Quilombolas, e não tem dado a devida atenção às leis que protegem as comunidades Quilombolas, citam a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre Povos Indígenas e Tribais, adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989 e a Portaria Interministerial nº 60, de 24 de março de 2015.) A primeira ressalta: ARTIGO 5 – A fim de garantir a adoção de medidas eficazes para a proteção, conservação e valorização do patrimônio cultural e natural situado em seu território, os Estados Partes na presente Convenção procurarão na medida do possível, e nas condições apropriadas a cada país: a) adotar uma política geral que vise a dar ao patrimônio cultural e natural uma função na vida da coletividade e a integrar a proteção desse patrimônio nos programas de planificação geral; b) instituir em seu território, na medida em que não existam, um ou mais serviços de proteção, conservação e valorização do patrimônio cultural e natural, dotados de pessoal e meios apropriados que lhes permitam realizar as tarefas a eles confiadas;

  1. c) desenvolver os estudos e as pesquisas científicas e técnicas e aperfeiçoar os métodos de intervenção que permitam a um Estado fazer face aos perigos que ameacem seu patrimônio cultural e natural
  2. d) tomar as medidas jurídicas, científicas, técnicas, administrativas e financeiras adequadas para a identificação, proteção, conservação, revalorização e reabilitação desse patrimônio; e natural e estimular a pesquisa científica nesse campo.
  3. e) facilitar a criação ou o desenvolvimento de centros nacionais ou regionais de formação no campo da proteção, conservação e revalorização do patrimônio cultural e natural e estimular a pesquisa científica nesse campo.) Que dentro do Território Quilombola precisa da auto identificação; consulta e participação; respeitando os direitos territoriais; e, desenvolvimento.

(Citam também a Portaria Interministerial nº 60, de 24 de março de 2015 CAPÍTULO I DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art.1o Esta Portaria estabelece procedimentos administrativos que disciplinam a atuação da Fundação Nacional do Índio- FUNAI, da Fundação Cultural Palmares-FCP, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN e do Ministério da Saúde nos processos de licenciamento ambiental de competência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA.

Baseado no Art. 3o No início do procedimento de licenciamento ambiental, os órgãos licenciadores deverá, na FCA, solicitar informações do empreendedor sobre possíveis intervenções em terra indígena, em terra quilombola, em bens culturais acautelados e em áreas ou regiões de risco ou endêmicas para malária.

CAPÍTULO II

II -em terra quilombola, quando a atividade ou o empreendimento submetido ao licenciamento ambiental localizar-se em terra quilombola ou apresentar elementos que possam ocasionar impacto socioambiental direto na terra quilombola, respeitados os limites do Anexo I.

As representações afirmam que já esteve na Secretária de Meio Ambiente, sempre verbalmente, buscando uma explicação oficial dos responsáveis, o qual afirmou ter comunicado Fundação Cultural Palmares, foi solicitado por parte dos representantes das comunidades Quilombolas cópia da comunicação enviada a Palmares, no entanto as comunidades nunca foram atendidas.  E só em janeiro de 2017 foi protocolado oficialmente um documento solicitando a  Licença Prévia –LP,  concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação;  Licença de Instalação -LI, que tem a função de autorizar a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental, mitigações e compensações e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante; e a Licença de Operação – LO que  autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental socioambiental  e condicionantes para a operação. No entanto a Associação Quilombola Agropastoril de Araça/Volta não recebeu nem um parecer.

Parque Solar em processo de construção, o Site Notícias da Lapa este no local no inicio de julho com representantes do Território Quilombola de Bom Jesus da Lapa

Na manhã desta terça-feira(29) mais uma vez uma das representações das comunidades tiveram na Secretaria de Meio Ambiente de Bom Jesus da Lapa, e foi garantido pelo Secretário de Meio Ambiente, Dr. Lúcio Magalhães, que vai ser passado toda documentação sobre os dois parques. Foi agendada uma reunião para esta sexta-feira(1º) com uma representante da BJL, responsável pelo empreendimento com as lideranças Quilombolas na comunidade   de Araça. Reunião deveria ter acontecido em outro momento, considerando que Empreendimento já está em fase de instalação.

Diante da situação a Associação Quilombola Agropastoril de Araça/Volta afirma que se a situação não for resolvida irá procurar o Ministério Público, e denunciam omissão da Fundação Palmares que é responsável por acompanhar as demandas dos territórios Quilombolas na região de Bom Jesus da Lapa, que tem se omitido.

Destacam que foi encaminhado mais de uma solicitação para a Fundação colocando a situação, no entanto não tem dado resposta, e nem fazendo esse diálogo com o município.

É importante frisar que de acordo o que determina a Portaria Interministerial nº 60, qualquer grande empreendimento que seja feito até 8 km de uma comunidade Quilombola, precisa dessas prorrogativas.

O debate proposto pela legislação auxilia na compreensão de quando e como as comunidades quilombolas deverão ser consultadas no processo de licenciamento ambiental. As comunidades precisam ser consultadas previamente para compreender como funciona o empreendimento, prever as consequências e saber onde recorrer caso sejam impactadas. Já os empreendedores devem ter consciência para atuar na legalidade e evitar danos além do necessário.  E no processo de estudo para implantação de um grande empreendimento é essencial a participação das comunidades nos estudos, na construção de medidas de controle e na mitigação de impactos. Outra preocupação das comunidades é a quantidade de Parques Solares que estão previstos para Bom Jesus da Lapa, a falta de informações por parte da Secretaria de Meio Ambiente, e a possível disputa das terras ocupadas pelas comunidades. Somando a isso, a especulação financeira sobre as terras da   região a partir dos empreendimentos, ou seja, os quilombolas precisam ter seus territórios titulados pelo Governo, terminando assim toda insegurança e medo da especulação fundiária sobre as terras ocupadas pelas comunidades quilombolas.

Edição: José Hélio